sexta-feira, 14 de novembro de 2014
Fraude: eles andam aí
Macau não é hoje o oásis de segurança que em tempos foi, é um facto, mas continua a ser uma cidade onde ainda é possível circular sem ser preciso andar a espreitar por cima do ombro. Quando cheguei ao território em 1993 fiquei impressionado pelo facto de se poder andar na rua a qualquer hora e em qualquer sítio sem encontrar uma figura suspeita, ou ser abordado por algum indivíduo com conversas fora do normal, ou evitar locais ermos onde fosse mais difícil pedir socorro ou contar com alguma alma caridosa que nos prestasse auxílio, nem que fosse apenas no sentido de alertar a autoridade mais próxima. Para quem vivia na margem sul e andava por Lisboa com frequência, era um luxo poder levantar dinheiro numa caixa automática sem o mínimo receio de ser assaltado, ou precisar sequer de olhar para um lado e para o outro a cada cinco segundos - aqui galgavam-se os becos e travessas mais recôndidos mesmo a horas proibitivas com as mãos nos bolsos e um assobio nos lados. A criminalidade acontecia, é logico, e sendo esta a cidade do jogo, com fama de longa data, não era difícil perceber de onde espreitava o perigo.
Achei pitoresco quando dei com aquele autocolante nos autocarros onde se lia "cuidado com os carteiristas", mas era raro acontecer um furto deste tipo, a não ser que a vítima estivesse a "dar sopa" e na mesma composição viesse também um dos agéis larápios. Era um pouco arriscado para uma senhora andar sozinha perto do Jockey Club na Taipa à terça-feira à noite, dia de corridas de cavalos, pois podia algum apostador mais "ressacado" podia aliviá-la do peso da bolsa. Assaltos à mão armada, estabelecimentos comerciais ou caixas multibanco eram raros, senão inexistentes, e o pior que podia acontecer era ter um "macaco" a entrar-nos pela janela de casa enquanto estávamos fora, e mesmo isto acontecia quase sempre nos prédios com cinco ou menos andares, onde não existia portaria. Eu próprio fui visitado por esses cavalheiros em duas ocasiões no mesmo ano (arrombaram a fechadura da porta; que desilusão...amadores) e nunca mais tive esse problema desde que fui viver para um edifício com elevador. E também não me levaram nada, e quem guarda centenas de milhares de patacas debaixo do colchão ou é parvinho, ou obteve o dinheiro através de meios pouco claros. Aproveito para referir aquele lamentável episódio ocorrido na semana passada, quando uma empregada filipina furtou um relógio "com um valor bastante elevado" da casa onde trabalhava, e após a queixa da entidade patronal foi detida e presente ao Ministério Público. O que não entendi, e continuo sem encontrar motivo para que se faça tal alarido, é o facto deste tipo de notícia ter honras de telejornal das 20:30, com a suspeita encapuzada, algemada e apresentada à imprensa como se fosse um atum premiado. Tudo por causa de um relógio?
Bastava no entanto atravessar as Portas do Cerco para deparar com uma situação diferente, e apesar de não ser propriamente o "faroeste", era recomendável exercer cuidados triplicados, especialmente para quem levava mala, que teria que transportá-la na frente, encostada à barriga. Aparecia uma vez ou outra um tipo mal encarado, com pinta de espertalhão, à procura de "patos" que caíssem em algum conto do vigário, mas sendo eu estrangeiro, não demoravam dois segundos a tirar-me o retrato e perceber que só iam perder o seu tempo. Com a política dos vistos individuais, começaram a chegar maus elementos em maior número - lógico, quando entram dez mil pessoas em vez de apenas mil, é possível também que entrem dez vezes mais "maladrins" e as parceiras, as "malandrinas". A criminalidade vai aumentado ao ritmo do aumento da população, e mesmo que os números do crime violento tenham subido ligeiramente, ainda não se pode dizer que a situação seja preocupante. É possível que na zona norte da cidade, mais perto da fronteira, haja mais trabalho para a polícia, mas nada de alarmante; não é nenhuma "Nova Iorque fora de horas ou algo que se pareça. Sim, há mais porrada, mais facada, um ou outro tirinho de vez em quando, e tornou-se mais perigoso sair à noite, especialmente para os jovens, mas não se esqueçam que a população de Macau aumentou na ordem dos 55% nos últimos 20 anos. É muito mais areia, e se a camioneta não consegue levar tudo de uma vez, faça mais uma ou duas viagens, ou aquelas que forem necessárias.
O que continua em alta - ontem e hoje, mas hoje é mais notório - são os chamados "truques de confiança", um tipo de fraude onde um grupo de malfeitores monta um pequeno "teatro" com a intenção de ludibriar algum cidadão mais ingénuo, convencendo-o eventualmente a passar-lhe todo o dinheiro da sua conta bancária para as mãos. Deixando de fora os crimes informáticos, ainda temos o velhinho truque do curandeiro, que resulta sobretudo nas senhoras de mais idade, ainda bastante supersticiosas, e o truque do "amigo que foi preso na China", que liga para um telemóvel em Macau, convence a pessoa do outro lado que a conhece, e mais tarde volta a ligar dizendo que "teve um problema" no continente e precisa de dinheiro urgentemente. Já tinha dito isto aqui no blogue mas repito: caso identifiquem um truque desta natureza, alertem as autoridades para esse facto, mesmo que não tenham sido enganados. A polícia ainda pode ir a tempo de deter os "artistas" antes que façam vítimas, e assim é melhor para todos. E agora atenção à novidade: esta tarde ligaram para casa, a minha mulher atendeu, e do outro lado estava alguém com uma voz baixinha, a choramingar, dizendo em cantonês "mãe, preciso de ajuda". Aconteceu o mesmo com alguns dos meus vizinhos, e pronto, nada de grave se passou, até porque o meu filho também estava em casa. Nestes casos, e isto não é para vos assustar mas apenas para ficar com a certeza de que está tudo 100% na paz dos anjos, combinem com os vossos filhos uma palavra-chave, qualquer coisa que vos possa garantir que é mesmo um truque. Sei lá, "cabeça de burro", "saco de plástico", uma "password" que só vocês saibam. Se quiserem ajudar as Forças de Segurança e sentirem que vos estão a tentar enganar, podem ainda fingir que caem no truque, e caso combinem um encontro ou uma transferência bancária, alertem antecipadamente as autoridades. Não se trata aqui de "armar-se em herói", mas contribuir para a segurança de todos. Agora ficar só a reclamar que a criminalidade aumentou não ajuda nada. E estejam sempre alerta!
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