terça-feira, 24 de junho de 2014
É preciso ter lata
O director do JTM, José Rocha Dinis, assina hoje nas páginas do seu jornal um editorial que só posso mesmo descrever numa palavra: lamentável. O não sei se o sr. Rocha Dinis, por quem tenho uma enorme estima como pessoa, faz isto de propósito, e se aquilo que diz na última página da Tribuna é fruto da sua mais firme convicção. A sério, gostava que ele me dissesse, e se estiver a ser sincero, respeito a sua posição, mesmo que discorde das suas ideias, mas o que me dá a entender aqui é que ele anda, como se diz em português escorreito, "armado em esperto" - sem ofensa, reitero.
Basicamente o sr. director do JTM (e recomendo que leiam o editorial) atribui ao calor e à humanidade próprias da época alguma da animosidade que se tem verificado pelo território nos últimos tempos. Eu próprio considero que este clima é para lá de desagradável, e mesmo residindo em Macau há mais de vinte anos, não me consigo adaptar e duvido que alguma vez consiga. É possível que o mesmo calor e humidade que agitam os ânimos e deixam algumas pessoas à beira de um ataque de nervos possam agravar também alguns quadros clínicos, nomeadamente os casos de gota, ou até afectar as funções renais de alguns marsupiais originários de outras paragens mais temperadas. Mas isto são coisas sérias com que é melhor não brincar, certo? Então com o que é que a gente brinca, para ver nos abstraímos do tempo incómodo, dos aguaceiros repentinos, e da roupa sempre colada ao corpo?
Pois é, os "maluquinhos" dos democratas, que estão sempre dispostos a partir a loiça toda, e estragar a festa à malta que só quer viver em harmonia. Que diabo, sempre a inventar estes gajos, e ainda por cima contam com a cumplicidade desses incompetentes que gerem as instituições de ensino superior do território, como por exemplo a Universidade de Macau (UMAC). Por exemplo, não, são o único caso, e...esperem lá, o sr. director do JTM chega hoje ao escritório, cantando e rindo, como é do seu timbre, e ao dar uma vista olhos pela "concorrência" depara com isto:
Bolas! A sério? Querem lá ver isto, ah? Agora os padrecos da São José também andam com os fusíveis fundidos com o calor. Pois, pois, as universidades "não têm obrigação de renovar o contrato a nenhum dos professores", mas estes nem sequer se dignaram a disfarçar nem nada. Ai o senhor docente é professor de Ciência Política e atreve-se a fazer comentários sobre...política??? Onde é que isto já se viu? A cadeira de Ciência Política faz parte do currículo de algum dos cursos, claro, mas não é suposto chegar ao ponto de ensinar os estudantes a pensar, ou dar este mau exemplo, fazendo comentários sobre política. Nota dez para a Universidade de São José. Já pensaram em mudar o nome para Universidade do Santo Ofício?
Mas adiante, o director do JTM levou as mãos à cabeça com o comportamento da UMAC, que escolhei a pior altura para anunciar a suspensão do professor Bill Chou: a cerimónia de graduação. Que raio, lá está outra vez o "timing". Há um "timing" para tudo, meus amigos, seja para aprovar leis ridículas que atribuem super-poderes ao Chefe do Executivo, para despedir professores que pensam pela própria cabeça, e para cometer homicídio - já agora, porque não? A melhor altura para "tratar" destes assuntos é o Inverno, que anda tudo muito parado por causa do frio e não apetece protestar - ninguém vai dar por nada, é limpinho.
Assim como fizeram as coisas é que não; a UMAC, só para chatear, deu publicidade ao processo contra o professor Bill Chou exactamente na semana que decorria a cerimónia de graduação, o que levou uma aluna a exibir um cartaz onde apoiava a liberdade académica - que audácia - e esta diz que foi retirada "de forma rude", e "pôs-se aos gritos". A histérica. Mas terá sido mesmo assim? Recordemos:
Valha-me Deus, quer dizer, na imagem em cima vemos a estudante a sair pelo próprio pé, e na imagem de baixo vemo-la cá fora "aos gritos", como se lhe tivessem feito mal. Eu estava em casa e ouvi os gritos da menina, mas pensei que se tratava de ópera chinesa, e os seguranças estavam tão encantados com o seu canto que ficaram cá fora a ouvi-la. Depois de ter exibido pacificamente um cartaz onde pedia "liberdade académica", e segundos depois ser acossada por meia dúzia de marmanjos e marmanjas que lhe destruiram o cartaz e arrastado cá para fora, ela devia era ter ido para casa, coitadinha. E ir fazer bolinhos para todos. La, la, la.
E depois o sr. director do JTM recorda ainda o momento em que os seguranças "rufias", não satisfeitos com o acto de censura exibicionista que tinham acabado de cometer, se "altercaram" com um "auto-denominado jornalista". Ora aí está, o rapaz não é jornalista, porque o tal "Macau Concealers" não é um jornal. Contudo estava acreditado para aquele evento, exibia de forma visível o cartão que provava essa mesma acreditação, mas pronto, não devia estar ali, enfim, o que querem que vos diga? Já quanto à funcionária dos Serviços do Saúde que se fez passar por jornalista e intrometeu-se num domicílio onde se realizava um esclarecimento reservado a profissionas da imprensa, e para qual não estava acreditada, tudo bem, já não é grava. Aliás o próprio director dos SS veio dizer que ela "agiu bem", e se ele disse é porque só pode ser verdade. Afinal o homem foi agraciado com uma medalha de mérito pelo Chefe do Executivo num 20/12 destes, bolas. É um santo.
Mas o tal pseudo-jornalista foi expulso "com algum dramatismo", e "diz ter sido agredido no pescoço". Portanto "algum dramatismo", e "diz ter ter sido agredido", alega V. Exa. Vejamos:
Portanto as duas imagens de cima só podem ser fotomontagens. Em vez de lhe terem arrancado à força o material fotográfico e de seguida derrubarem-no, os seguranças da UMAC pediram-lhe com modos para que se retirasse, deram-lhe dinheiro para o táxi, e presentearam-no com duas lapiseiras com o logotipo daquela instituição de ensino, mais um brochura e alguns postais com bonitas imagens do novo campus. Mas o sacana usou as lapiseiras para se auto-flagelar, e lá fora aguardava-o uma falsa ambulância, propriedade desses grupos de malandrins agitadores que por aí andam a dar cabo da harmonia, que o levou ao hospital, onde em conluio com um médico (ou auto-denominado médico) obteve uma declaração de que foi agredido. Só pode ser isso, com toda a certeza.
Agora falando a sério, meu caro José Rocha Dinis, e mais uma vez repito: não é nada de pessoal. Penso que chegou a altura de percebermos que o tempo de deixar os insatisfeitos cá fora a falar sozinhos e fazê-los passar por maluquinhos já lá vai. Também eu sou apologista de uma sociedade harmoniosa, com toda a gente feliz, etcetera e tal, mas perante tanta inércia e tanta indiferença da parte de quem deve proporcionar esse estado de coisas, o que acha que as pessoas devem fazer? Ficar sentadas enquanto os mesmos vão enriquecendo, enquanto os jovens não conseguem adquirir habitação própria? Que as elites se metam num barco ou num avião particular e vão tratar da saúde saúde aqui ao lado em Hong Kong ou no estrangeiro enquanto os velhos precisam de esperar horas e horas por um consulta que marcaram com meses de antecedência? Que passem leis que lhes garantem mais benefícios e imunidades que levantam suspeitas, e a população ria e bata palmas, e ainda agradeça o cheque anual que já mal chega para tapar buracos?
Eu fico feliz que em Macau a população, nomeadamente a mais jovem, desenvolva uma consciência cívica e política, e para mim já vai tarde. Se eles estão organizados, tanto melhor, mais mérito para eles. Não estou do lado do ninguém nem contra ninguém, mas já é tempo do Governo tirar a cabeça da areia e olhar à sua volta, ver o que faz falta fazer, e responder às necessidades da população. Sim, porque Macau é sobretudo a sua população, e não só os casinos, os turistas, os restaurantes e o imobiliário. Há gente cá dentro. Não vai ser a silenciar as vozes incómodas que vão lá, nem a passar atestados de burrice às novas gerações, dizendo-lhes que não precisam de pensar ou ter opinião formada, e que da política tratam eles - não têm tratado de nada, e não só não fazem como ainda não deixam fazer! Sei que o José Rocha Dinis esteve envolvido nas lutas estudantis nos seus tempos de estudante em Coimbra, e deve ter sentido na pele o que é ser tratado como um "mau elemento", uma "ovelha negra" ou um "maluquinho". Não caia na tentação de ficar do lado contra o qual lutou, por se manter firme aos valores que acreditava.
És mesmo burro!
ResponderEliminarOh, oh, oh. Naa...sou um maluquinho não é? O melhor é deixar-me aqui a falar sozinho. Mas obrigado pelo seu contributo para a discussão; diz tudo da sua capacidade argumentativa ;)
ResponderEliminarCumprimentos
Triste esse comentário "és mesmo burro" mais ainda que o editorial do JTM. E explicar o que estava errado na análise feita?
ResponderEliminar