sexta-feira, 30 de maio de 2014
A caminho do Brasil: feijões saltadores
O que nos vem à cabeça quando ouvimos falar de México? Speedy Gonzalez, mariachis, tequila, tacos, burritos, enchiladas, sim, por acaso a comida "tex-mex" é de se lhe tirar o "sombrero", especialmente se for regada com Corona, "la cerveza mas fina" - aproveito para mandar um grande abraço à Marisol, do Restaurante Tacos, a embaixadora mexicana não-oficial em Macau. Pois é, gostaria imenso de ficar aqui a falar de outros aspectos do México, mas esta é uma rubrica de futebol, e os mexicanos adoram futebol. Apesar do sucesso em campeonatos do mundo se resumir a duas presenças nos quartos-de-final, e apenas quando organizou por duas vezes o torneio, a selecção mexicana tem 14 (catorze) participações em fases finais, sendo apenas superada por Argentina, Itália, Alemanha e Brasil. É um facto que estando colocada na zona CONCACAF de apuramento, que engloba as federações da América Central, Norte e Caraíbas, a concorrência não é muita, e seria problemático qualificarem-se se estivessem colocados na zona sul-americana, para não dizer na Europa, o que seria irrealista. Mesmo assim, e devido a um grande investimento nos últimos 30 anos, o México é uma potência no futebol jovem, e atingiu o pique da evolução nos escalões de formação quando há dois anos venceu o torneio olímpico em Londres, derrotando na final o Brasil. A selecção principal tem beneficiado de crescente número de estrangeiros a alinhar no futebol europeu, e tem trazido dos mundiais algumas boas recordações, com uma vitória na Taça das Confederações pelo meio, no ano de 1999, realizada exactamente no México. Vamos então à resenha histórica.
Antonio Carbajal, uma lenda...dentro do género.
A selecção mexicana foi uma das convidadas pela FIFA a participar na edição de estreia do mundial, realizada no Uruguai, e demonstrou ser, a par da Bolívia, a equipa mais frágil, perdendo os três jogos que disputou por goleada: 1-4 c/França, 0-3 c/Chile e 3-6 c/Argentina. Em 1938 foi necessário passar pela qualificação, e aí perdeu a vaga para os Estados Unidos. Sem participar em 1938, regressaria em 1950 no Brasil, perdendo de novo todos os jogos da fase de grupos, e quatro anos depois na Suíça, mais do mesmo. Com oito derrotas noutros tantos jogos, os mexicanos conseguiram finalmente não perder uma partida no mundial de 1958 na Suécia, onde na fase de grupos conseguiram um empate a um golo com o País de Gales. Antes haviam perdido por 3-0 com a Suécia e a seguir perdiriam por 4-0 com a Hungria, mas foi um progresso. Em 1962 no Chile estreavam-se a perder por 0-2 com o Brasil, com golos de Zagallo e Pelé, e depois com a Espanha por 0-1, e já sem hipóteses de qualificação, acontecia algo de extraordinário: venciam a Checoslováquia por 3-1! Foi um "cinco de mayo" fora de época no país dos aztecas, pois à 14ª tentativa, lá conseguiam ganhar um jogo de um campeonato do mundo. Em 1966 Inglaterra também não estiveram mal, apesar de não conseguirem repetir o feito do mundial anterior, e empatavam com França e Uruguai, perdendo apenas por 0-2 para a equipa da casa. Estes cinco mundiais entre 1950 e 1966 tiveram algo em comum na equipa mexicana - o guarda-redes. Antonio Carbajal, que tinha 21 anos acabados de fazer quando se estreou no mundial do Brasil, e 37 quando se despediu na Inglaterra, reparte com o alemão Lothar Matthaus o recorde do jogador com mais presenças em fases finais de mundiais, mesmo tendo alinhado apenas em 11 partidas, contra as 24 de Matthaus. A título de curiosidade, o senhor ainda está vivo, e tem a bonita idade de 84 anos.
Pode-se dizer que Carbajal nasceu demsiado cedo, pois logo no primeiro mundial após "pendurar as luvas", o "seu" México organiza o torneio final, e chega pela primeira vez à fase seguinte. Nesse ano de 1970, onde Pelé teve o "seu" mundial, os mexicanos passaram o Grupo 1 com um empate a ero com a União Soviética, e vitórias por 4-0 sobre El Salvador e 1-0 sobre a Bélgica - e só para chatear o pobre Carbajal, não consentiram qualquer golo nesta primeira ronda. Tudo mudaria de figura nos quartos-de-final, onde a poderosa Itália não lhes deu qualquer hipótese, vencendo por 4-1, apesar dos mexicanos se terem adiantado no marcador aos 13 minutos, com um golo de Jose Luis Gonzalez. Os anos 70 não seriam favoráveis à selecção mexicana, que falharia o mundial da Alemanha em 74, e em 78 na Argentina voltaria a perder todos os jogos da fase de grupos. Em 1982 também não seria capaz de se qualificar para o mundial de Espanha, perdendo para as Honduras na qualificação.
Mas nada como organizar um campeonato do mundo para deixar os mexicanos inchados de orgulho. Em 1974 a FIFA atribuíu a organização do mundial de 1986 à Colômbia, mas três anos antes do torneio, os sul-americanos alegaram razões económicas para desistir, e já que o México tinha as infra-estruturas de 70 ainda mais ou menos em condições, foi só mudar o mundial um pouco mais para o norte. Novamente como país organizador, o México tinha uma das suas melhores gerações de futebolistas de sempre, e foram estes a base para o relativo sucesso da equipa actual. A grande estrela da companhia era o avançado Hugo Sanchez, que fez história ao serviço dos espanhóis do Real Madrid, e já antes disso tinha dado provas no Atletico de Madrid. Integrados no Grupo B, com Bélgica, Paraguai e Iraque, os mexicanos arrancaram com uma vitória por 2-1 contra os belhas no Estádio Azteca, a rebentar pelas costuras, com 110 mil espectadores nas bancadas. Hugo Sanchez seria o autor do segundo golo da equipa da casa. Depois de um empate a um golo com o Paraguai, vitória por 1-0 contra o Iraque, e passagem garantida à fase seguinte, e em primeiro lugar no grupo.
Nos oitavos-de-final o México teve um adversário acessível, a Bulgária, repescada do Grupo A. O primeiro golo foi da autoria de Carlos Negrete, e que grande golo, que viria a constar da galeria dos melhores golos de sempre em mundiais de futebol. Esta vitória contra os búgaros foi a única do México em fases a eliminar dos campeonatos do mundo. Negrete passaria por Portugal, pelo Sporting, onde não teria sucesso. Nos quartos-de-final os mexicanos encontravam a Alemanha Ocidental, e apesar de terem aguentado o nulo no marcador durante os 120 minutos, pecariam pela má pontaria na lotaria dos "penalties", onde apenas Negrete conseguiu concretizar, contra a eficácia plena dos quatro remates alemães. Apesar do melhor resultado de sempre, o México ficaria de fora do mundial de Itália em 1990, pois as suas selecções foram todas banidas pela FIFA por dois anos em 1988, devido a um escândalo de falsificação da idade de jogadores durante o apuramento para o mundial de juniores de 1989.
Seria a estratégia distrair os avançados?
Em 1994 o México regressaria no mundial dos "vizinhos" Estados Unidos, e a partir daqui não mais falharia uma fase final, e sempre com o mesmo resultado. Hugo Sanchez, então ao serviço do Rayo Vallecano, regressou aos 35 anos, mas a estrela maior era o guarda-redes Jorge Campos, que em sete anos ao serviço dos Pumas tinha apontado 34 golos no campeonato mexicano - a maioria de livre ou de "penalty", mas também alguns que resultavam de jogadas de bola corrida, pois em algumas partidas jogava na posição de avançado. No entanto Campos nunca se atreveu a fazer o mesmo pelo México, ou nunca jogou noutra posição além da baliza, pois em 130 internacionalizações nunca marcou um único golo - nem de "penalty". Participou em três mundiais, entre 1994 e 2002, e nos Estados Unidos os mexicanos estavam praticamente a jogar "em casa", apesar da primeira fase ter sido passada com dificuldade. Depois de uma derrota chocante frente à Noruega por 0-1, veio uma vitória contra a Rep. Irlanda por 2-1, e um empate a um golo com a Itália dava não só o apuramento, como também a vitória no grupo. Nos oitavos-de-final o "carrasco" foi a Bulgária, que se "vingaria" de 86, e tal como contra a Alemanha Ocidental nesse ano, o México era afastado nos "penalties". Em 98 passam o grupo com a Holanda, deixando a Bélgica de fora, e nos oitavos perdem com a Alemanha por 2-1. Em 2002 vencem um grupo complicado, com Itália, Croácia e Equador, mas são surpreendidos pelos vizinhos e rivais Estados Unidos nos oitavos, por 2-0.
Em 2006 o sorteio dos grupos para o mundial da Alemanha determina que o México vá jogar pela primeira vez com a selecção portuguesa em campeonatos do mundo. Preocupante para Portugal, sabendo da tendência para os mexicanos passarem a fase de grupos, mas com o Irão e Angola como restante concorrência, era fácil prever que os portugueses passariam juntamente com os centro-americanos. E assim foi, pois após vitórias sobre Angola por 1-0 e Irão por 2-0, Portugal defrontava o México em Gelsenkirchen já com o apuramento garantido, e alinhava com uma equipa de segunda linha, bastando o empate para vencer o grupo. Os mexicanos tinham vindo de uma vitória por 3-1 frente ao Irão, e de um empate sem golos com Angola, e estavam obrigados a vencer se quisessem terminar à frente dos portugueses. Só que mesmo sem alguns habituais titulares, Portugal chegava aos 24 minutos a vencer por 2-0, com golos de Maniche e Simão, este de "penalty", mas cinco minutos depois o México reduzia por Kikin Fonseca, que passaria mais tarde pelo Benfica, mesmo que discretamente. Portugal venceria o jogo por 2-1, e o México seria afastado nos oitavos pela Argentina por 1-2, após prolongamento.
Em 2010 na África do Sul o México tinha finalmente um desafio à altura. No Grupo A com a equipa da casa, a França, finalista em 2006, e o Uruguai, ninguém se atrevia a excluir nenhuma das equipas da fase seguinte da prova. Treinados pelo ex-internacional Javier Aguirre, que já tinha comandado a selecção no mundial de 2002 e vencido em 2009 a Gold Cup, a competição continental da CONCACAF, os mexicanos contavam com jogadores da classe de Ricardo Osorio, Carlos Salcido, Gerardo Torrado, Carlos Vela ou Giovani dos Santos, a geração com mais jogadores a alinhar na Europa, e capitaneados por Rafael Marquez, que entre 2003 e 2010 representou o Barcelona, vencendo por duas vezes a Liga dos Campeões. Depois de um empate a um golo frente à África do Sul na estreia, veio a vitória por 2-0 contra a França, onde o México mostrou porque se qualifica sempre para a segunda fase dos mundiais. Os golos foram apontados por Javi Hernandez, conhecido por "Chicharito", ou "pequena ervilha", que na altura com 21 anos ganhava tanto protagonismo que assinaria pelos ingleses do Manchester United. O segundo golo foi apontado pelo veterano Cuauhtémoc Blanco. E quem é este tipo com um nome próprio tão castiço? Vejam bem:
Isso mesmo. E Blanco, que participou em três campeonatos do mundo e um sem número de torneios pela selecção mexicana, incluíndo os Jogos Olímpicos de 1996 em Atlanta, e a gloriosa campanha na Taças das Confederações em 1999. Um total de 123 internacionalizações, com a última esta quarta-feira, aos 41 anos, num particular frente a Israel, que os mexicanos venceram por 3-0. Mas de volta a 2010, o México perderia depois com o Uruguai na 3ª jornada do grupo, e nos oitavods novamente com a Argentina treinada por Maradona, por 3-1, e desta feita sem necessidade de recorrer a prolongamento. Neste mundial de 2014, e depois de um apuramento mais complicado que o habitual, estão no grupo do Brasil, a equipa da casa, Croácia e Camarões. A confirmar-se a tendência dos últimos anos, "canarinha", croatas e africanos terão que disputar a "outra" vaga de acesso aos oitavos, e nessa fase quem defrontar os mexicanos, pode começar já a pensar nos quartos-de-final. Arriba!
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