segunda-feira, 23 de dezembro de 2013
O sr. rato e as batatas fritas
Não fiquem alarmados, pois o título é "O sr. rato E AS batatas fritas", e não "O sr. rato COM batatas fritas". Eu sei que estamos no Natal, mas continuo a não prescindir da dialéctica bacalhau/perú para a ceia da Consoada, e eventualmente uma ou duas fatias de lombo de porco assado, "para desenjoar". O mais remotamente semelhante com um rato que vou comer essa noite é a lampreia de ovos. Bem, isto tudo para dizer que eu e o sr. rato continuamos de relações cortadas, em Guerra Fria - e com estas temperaturas não podia ser outro tipo de guerra.
A minha estratégia de não alimentar mais o sr. rato foi inspirada no Holodomor, o holocausto ucraniano provocado por Estaline, que lhes roubou a comida toda para os matar de fome. Só que ao contrário de Estaline, dou a plena liberdade ao sr. rato para desopilar daqui para fora e ir procurar outro tanso para andar a ratar, e ele não aproveita. E como reagiu ele ao facto de não o deixar mais guloseimas? Aceitou desportivamente, como faria uma cavalheiro? Nada disso. Tem-se comportado como um...como um...rato! Sim, como um autêntico rato.
Desde o episódio do saco do lixo à porta, tenho evitado deixar qualquer forma de lixo em casa durante a noite, e deixo toda a comida que esteja a descongelar devidamente tapada e inacessível aos apetites do sr. rato. Mas o sr. rato aproveita qualquer descuido, e tem uma fantástica capacidade de improvisação. Depois de me ter tentado atacar os pacotes de bolos filipinos, ganhou um gosto com os pacotes, e isto leva-nos de seguida ao último (duplo) incidente, que se deu na noite de Sábado para Domingo. Mais uma demonstração de ratice da parte do sr. rato.
Tinha ido dormir depois do jogo do Sporting, e pelas sete da manhã, estava eu ainda na fronteira entre o primeiro e o segundo sono, oiço um barulho de patas a esgravatar qualquer coisa, e o som metálico dava a entender que se tratava de um pacote de comida. Dou um murro na parede, e o barulho cessa por alguns instantes. Alguns, poucos. Quando o esgravatar e o arrastar do metal se torna mais evidente, resolvo finalmente levantar-me da cama e pôr ordem nesta barafunda. Foi aí que - choque - deparo com o pacote de batatas fritas da Lay's que tinha deixado junto com o resto de umas compras que tinha feito essa tarde, no chão da sala, e acabadinho de ganhar um buraco, que o sr. rato fez durante a fuga precipitada no momento em que acendi a luz.
Que mau, sr. rato. Eu deixava comida para V. Exa. sem que a isso fosse obrigado, mas pelos vistos habituei-o mal. Agora se não lhe dou, rouba. Parece um daqueles agarradinhos ao cavalo ou ao "crack", a quem dávamos uma moedinha na esperança deles se endireitarem, e quando desistimos começam-nos a assediar, a seguir-nos até casa, a meterem tudo o que vêem ao bolso, se os deixamos entrar. A minha desilusão duplicou quando reparei que a caixa de "Turkish Delights" que tinha guardada para prenda de Natal de emergência estava roída num dos cantos, e tinha mesmo um buraco! O que vou oferecer agora àquelas pessoas a quem não nos apetece nada dar uma prenda, mas o melhor é dar-lhe qualquer coisinha para ver não ainda por aí depois a falar mal, feita uma arara?
O sr. rato perdeu-me o respeito por completo, tal como qualquer carunchoso perde o respeito por quem o trata bem. Imagino-o todo ressacado a cheirar à volta da sala e a dizer: "Ai não me dás nada, meu? Então agora és assim? Vai-te lixar meu! Chama a bófia se quiseres meu, tou-me a kagar, pá! E sai mas é da minha frente, 'tás a ouvir?". Mas eu entendo-o sr. rato. Eu sei que tem um lado bom, e está apenas a passar por uma fase difícil. Proponho-lhe uma trégua natalícia, e pode ser que amanhã à noite lhe deixe um "Turkish delight" no pratinho com o desenho do Templo da Barra. Se queria um, era só pedir; não era preciso roubar. Mas olhe, enquanto penso nisso, desejo-lhe um feliz Natal, sr. rato. Depois logo se vê.
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