sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Lições de cantonense, parte IX: traços e riscos


A caligrafia chinesa é considerada uma forma de arte.

A língua chinesa, como todos sabemos, não usa o abcedário ocidental, e recorre a um sistema semelhante ao dos hieróglifos egípcios: os caracteres. A escrita em chinês está mais ou menos uniformizada na região Ásia-Pacífico. Um texto em chinês clássico é entendido na perfeição pelos falantes do continente e de Taiwan, e pelos falantes do cantonense de Hong Kong e de Macau. A única diferença reside nos caracteres simplificados, utilizados na República Popular, e rejeitados pelos restantes.


Os caracteres chineses, conhecidos por "hanzi" (caracter dos han) são logogramas, e o seu uso reporta-se à idade do bronze, mas a sua origem data do neolítico, de pictogramas semelhantes a algumas imagens comuns nas pinturas rupestres. Muitos desses pictogramas evoluíram para os modernos caracteres, e ainda hoje alguns têm uma grande semelhança com os originais. Existem mais de dez mil caracteres, mas um chinês com um nível secundário de educação conhecerá apenas entre 4 mil e 5 mil. Os caracteres japoneses (kanji) e coreanos (hanji) derivam da mesma matriz dos chineses, sofrendo uma evolução diferente. Nem toda a China utiliza os "hanzi", existindo outros tipos de escrita reconhecidos - um facto verificável nas notas de renminbi.


Para um ocidental que nunca tenha tido contacto com os "hanzi", os caracteres chineses não fazem qualquer sentido, e não parecem mais que uma confuse amálgama de traços. E não é fácil aprender a escrever estes caracteres, mesmo para os chineses. Na China ainda existe uma elevada percentagem de analfabetos, e para combater esse problema foi criado o sistema simplificado, mais usado na RPC, mas reconhecido em Macau e Hong Kong. Os chineses começam a praticar a escrita e a memorizar os caracteres por volta dos 3 anos; enquanto um chinês escolarizado desenha os caracteres com uma velocidade estonteante, os ocidentais precisam de copiar o desenho, e por muito que se esmerem o resultado ainda deixa muito a desejar.

Desenhar um caracter tem regras, que depois da assimilação e da prática, até parecem simples. O caracter é composto por traços, existindo dois tipos: os simples e os compostos, e há cerca de trinta reconhecidos entre os mais utilizados. Os traços são desenhados de cima para baixo e da esquerda para a direita, formando um caracter simples, também chamado de "radical". Nos caracteres mais complexos entram dois ou mais radicais, e a sua ordem é igualmente da esuqerda para a direita, confome o sentido que se procura. A junção de dois radicais pode ter significados diferentes conforme a ordem onde são colocados no caracter.


Biang, um tipo de massas de Shaanxi, é representado pelo caracter em cima.

O radical é um caracter simples que, isoladamente tem o seu próprio significado. Os mais utilizados são 木 (madeira), 人 (pessoa), 日 (sol), 月 (lua), 女 (mulher), 火 (fogo), 山 (montanha), 金 (ouro), 中 (centro), entre outros. Para exemplificar como funcionam estas combinações, eis alguns exemplos mais simples: fogo e madeira juntos (火 + 木) resulta em 焚, que significa "arder". Pessoa e madeira juntos (人 + 木) dá 休, ou "descansar", cuja ideia representa "homem encostado a uma árvore". O sol e a lua juntos (日 + 月) dão 明, que é "brilho". Muito giro. Podem-se combinar mais de dois radicais, como no exemplo da imagem em cima. O caracter mais complexo é 𪚥, composto por quatro dragões (龍), num total de 64 traços, e significa "verbose", a utilização de mais palavras numa frase do que o necessário; redundância. Não existe um único caracter chinês que não seja composto da combinação dos radicais existentes e não existe nenhum radical formado com outra coisa que não os trinta traços reconhecidos.

Para um adulto que não conheça um único caracter e queira aprender chinês são necessários alguns anos até conseguir ler um texto com 50 ou 60 frases. A aprendizagem requer muita prática a um ritmo diário, muito estudo e muita curiosidade. Se só agora vai começar, boa sorte!

1 comentário:

  1. Pena que, no brasil, o governo e instituições de ensino sem fins lucrativos ou que cobrem preços razoáveis não perceberam ainda o potencial do mandarim. Cursos difíceis de encontrar ou muito caros.

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