MEC: a entrevista que faltava

Miguel Esteves Cardoso deu na última quinta-feira uma entrevista à jornalista Fátima Campos Ferreira, da RTP, recebendo-a em casa na companhia da sua mulher de há 13 anos, Maria João Pinheiro. O cronista luso-inglês de 57 anos, que se deu a conhecer ao país em finais dos anos 80 como candidato ao Parlamento Europeu, falou da vida, da escrita, do drama pessoal que foi a doença de Maria João, e do seu novo livro, “Que Linda é a Puta da Vida”.

O seu último trabalho, uma compilação de crónicas que assinou no jornal “Público” nos últimos seis anos, é aquele que considera “o mais pessoal, o primeiro em que mistura a sua escrita com a sua vida”. Muitas destas crónicas foram escritas enquanto a sua mulher batalhava com um tumor maligno na cabeça, e a primeira é exactamente intitulada “Carta a Deus”, onde o escritor questiona o Criador sobre a justiça de tudo de mau e bom que nos acontece, do livre arbítrio, do sentido da vida, no fundo.

MEC, como é carinhosamente conhecido, fala de Deus, da vida, do país que ama, Portugal, e muito mais nesta entrevista de pouco mais de trinta minutos, que recomendo, e pode ser vista aqui no sítio da RTP. É um personagem caricato, difícil de digerir no início. Aparência bizarra, discurso meio intermitente, tiques esquisitos, mas que dá gosto ouvir, e quem já leu o que escreve (orgulho-me de ter TODOS os seus livros, com excepção de “Cemitério de Raparigas”) sabe do que falo. É um brilhante observador, com um sentido de humor inconfundível e um uso exímio da ironia e do sarcasmo.

Na parte final da entrevista, MEC deixa uma definição tão genial quanto comovente sobre o significado da vida e a inevitabilidade da morte. A morte não é mais do que tinhamos antes da vida; não existimos durante séculos, milénios, e vamos deixar de existir pelo mesmo período depois da morte; a vida, portanto, é isto, é agora. A vida é como as férias grandes quando andávamos na escola: no início sentimos todo o tempo do mundo pela frente, mas depois chega o final de Agosto, o primeiro dia em que já não vamos mais a praia, e aproxima-se o fim. Lindo. Obrigado, Miguel. Continua a ser quem és.