domingo, 16 de dezembro de 2012
Saudades dos concursos
Assisto sempre que tenho oportunidade a concursos televisivos transmitidos pela RTPi. Não sei se em Portugal existem concursos mais interessantes que estes com que levamos aqui em segunda mão, mas a Casa dos Segredos, por exemplo, não será um deles. Aliás os “reality shows”, ainda por cima portugueses, são algo que me causa alguma confusão. Quase todos tivemos um vizinho alcoólico que batia na mulher e nos filhos, e que na volta recebia a visita da polícia, o que era muito mais interessante que um “reality-show” feito em Portugal, mesmo que apenas ouvido da varanda ou através da parede. Os portugueses mal sabem representar, quanto mais tentar agir com naturalidade sabendo que têm uma câmara apontada para eles com o país inteiro a ver. Aí ficam maluquinhos e comportam-se como atrasadinhos mentais.
Mas voltando a isto dos concursos, alguns são assaz interessantes. O “Decisão Final”, apresentado por José Carlos Malato, é o meu favorito, pois é um concurso de perguntas de cultura geral. Algumas destas perguntas, que ainda por cima oferecem três opções de resposta, são relativamente fáceis, mas mesmo assim alguns concorrentes erram. No outro dia assisti ao ridículo de ver um jovem passar a pergunta “Qual é a cor do cavalo branco de Napoleão?” (a sério, juro), o que arrancou alguns risos da plateia. Mas nestas coisas da cultura geral já se sabe, uns sabem mais de umas coisas que outras, nem todos são cultos e letrados, e acho que não existe uma pré-selecção. O inconfundível Malato tem a vantagem de ser um brilhante comunicador, e deixa os concorrentes com um grande à vontade. Não deve ser fácil demonstrar interesse pela vida, personalidade e passatempos de tanta gente que por ali passa. Será que o Malato os reconhece se os vir na rua?
Mas já que falamos de perguntas fáceis, aos Domingos de manhã passa o concurso “Aqui Portugal”, apresentado por Sónia Araújo, e que considero um insulto aos portugueses que vivem no estrangeiro. Este “Aqui Portugal” é produzido especialmente para a RTPi, o que significa que muita gente em Portugal não deve sequer ter ouvido falar. As perguntas de História, Geografia, Português e afins estão ao alcance de alunos médios do 4º ano, e o vencedor é determinado por um sistema arcaico: responde quem carrega primeiro no botão, e ganha quem tiver mais pontos, ou respostas certas. Isto vale por dizer que quem for mais expedito a carregar no botão e responder primeiro, ganha com toda a certeza. A apresentadora tem uma mania que chega ser irritante. Se a resposta for “Cabo Verde”, pergunta ao concorrente “Já foi a Cabo Verde? Não? Devia ir, é muito bonito”, se é Serra da Estrela pergunta “Já foi à Serra da Estrela? Não? Eu já fui e recomendo”. Enfim, a Sónia já foi a todo o lado, já deu a volta ao mundo várias vezes. Será que ninguém percebe que os emigrantes portugueses têm nos seus países de acolhimento concursos muito bem produzidos e que são sucessos de audiência? Isto até parece uma esmolinha, tomem lá para matar saudades, pobrezinhos. Respondam lá a esta pergunta de Português: Como se chama um dedo do meio esticado? A) um manguito b) um chiquito ou c) um conguito. Já fez um manguito? Não? Eu já, ao “Aqui Portugal”. E gostei muito.
Finalmente um concurso que não trata de cultura geral, mas é um espectáculo! O Preço Certo, apresentado há anos por Fernando Mendes, é um sucesso, muito graças à forma divertida com que o apresentador conduz o programa que só por si nem vale grande coisa: trata-se de acertar preços de produtos diversos e no final o valor de uma montra recheada de prémios. É uma passerelle de publicidade a marcas. A simpatia de Fernando Mendes e a forma como lida com os concorrentes, alguns deles pessoas simples originárias do interior do país, é comovente. Especialmente a maneira como os deixa falar e comportar da forma mais extravagante e embaraçosa que se possa imaginar, e consegue mesmo assim impedir que façam figuras tristes. Pode-se dizer que é uma espécie de psicólogo que providencia a muitos os seus quinze minutos de fama. Praticamente todos os concorrentes trazem recordações, produtos regionais, galhardetes, camisolas, um pouco de tudo. Acho piada como algumas localidades obscuras mandam lembranças ao concurso através do conterrâneo concorrente como se este fosse algum missionário ou embaixador da boa vontade, que vai colocar finalmente a terreola no mapa. Se existe algum museu do Preço Certo gostava de visitá-lo. Devem estar lá representadas todas as juntas de freguesia de Portugal, de Caminha a Vila Real de Sto. António. O que o apresentador gosta mesmo é que lhe tragam comidinha e vinhaça, o que talvez explique o seu largo porte. Ser obeso e ao mesmo tempo uma estrela da TV não é fácil, nem politicamente correcto, mas ele lá vai transpirando popularidade, além de quantidades copiosas de suor. É um espectáculo!
Sempre gostei de concursos televisivos, e penso que em Portugal passaram vários que fizeram história. O primeiro que me lembro de assistir foi o “Toma lá, dá cá”, apresentado por Artur Agostinho, e apesar da bronca na final (quem se lembra?) tive uma forte razão para ganhar o gosto a concursos. Não era grande adepto do “1,2,3”, do qual nunca percebi a razão do tremendo sucesso, mas recordo-me com carinho do “Par ou Impar” ou do “Com Pés e Cabeça”, ambos apresentados pelo saudoso José Fialho Gouveia. Cultura geral propriamente ditos era no “Casa Cheia”, que contava com uma pré-selecção que só deixava participar pesos-pesados, e até o “Palavra puxa Palavra” era mais ou menos interessante, não obstante de ser apresentado pelo cromo do António Sala. Mas o melhor era mesmo a “Roda da Sorte”, apresentada por Herman José. O concurso era o que menos importava, pois este foi o melhor período de sempre do Herman, a sua idade de ouro. Com a cumplicidade da voz-off de Cândido Mota, o concurso americanóide insonso que consistia em girar uma roda, escolher letras e adivinhar puzzles catapultou este duo para a fama, e confirmou o Herman como o maior humorista português. Infelizmente mais ou menos na mesma altura o mesmo Herman começou a apresentar ao Sábado o “Parabéns”, que era mais um talk-show com muito pouco ou nada de concurso, e que foi uma espécie de prenúncio do que aí vinha, e a verdade é que ainda hoje o humorista continua a insistir neste formato, agora assumidamente como talk-show. Mas são muito boas recordações estas. Os poucos concursos que agora aqui nos chegam estão muito longe destes tempos áureos, mas servem para matar saudades. Um bocadinho, enfim.
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