quinta-feira, 24 de março de 2011
A tradição já não é o que era (e ainda bem!)
Uma colega minha deu recentemente à luz um lindo rapaz, e fui visitá-la ao hospital, onde conheci a restante família, um grupo de neguinhos chineses super-simpáticos. Agradeceram o “incómodo”, e ficámos lá a trocar dois dedos de conversa, e fiquei a saber que esta minha colega e o marido são casados há quase 10 anos, e resolveram só agora acrescentar à família, pois este era o primeiro filho de ambos.
Debati este assunto com outra colega esta manhã, que diz que “não há nada de estranho”, que “quiseram viver a vida primeiro” e depois só agora ter filhos. Retorqui que sim senhor, tudo muito bem, mas que para isso não seria necessário casar, e o que propósito do casamento entre duas pessoas que se amam (deixemos aqui de fora os casamentos para aquisição do BIR) será de ter filhos, de formar uma família, portanto. Claro que a minha colega faz aquilo que muito bem entender com a sua vida, e se quiser casar e nunca ter filhos, isso é lá com ela. Só que no fim cheguei à conclusão que o facto de terem casado foi uma espécie de contrato de exclusividade, como que para “trancar a resposta”, usando a terminologia do concurso “Quem quer ser milionário”.
A minha outra colega ficou um bocado sem resposta, mas continuámos a conversa, falando das diversas modalidades de casamento e paternidade, de casais solteiros, de casais que casam porque a moça engravidou (aquilo que os americanos chamam “shotgun wedding”, muito comum em todo o mundo), etc. A certa altura a conversa foi parar à “tradição”, e mais cedo do que tarde levei uma boca do tipo “não sei como é lá no teu país, mas aqui as pessoas casam primeiro, e depois têm bebé”. “Aqui ponto e vírgula – respondi-lhe de pronto – “É assim na tua casa”. É muito engraçado quando os chineses jogam para cima de nós a carta da tradição, mas é claro que isto chega a ser até irónico, atendendo a que tal como nós ocidentais, também não são nenhuns anjinhos. Quem conheça mal o Oriente se calhar pensa que os casamentos chineses são qualquer coisa de místico e sagrado, e que na China “não existem divórcios”, ou que os neguinhos não enfeitam o pára-choques uns dos outros com um belo par de chifres de vez em quando.
Não cabe na cabeça de ninguém nos dias de hoje pensar que o casamento deve ser requisito para que alguém possa ter filhos. Já chegou o que chegou em Portugal, por exemplo, onde até há relativamente pouco tempo (anos 60) um filho nascido fora do casamento era um “bastardo”, e que um casal que não tivesse o papel assinado vivia em “fornicação”. Foi mais um contributo da nossa estimada Igreja Católica para o atraso das mentalidades e para a humilhação dos pobres pecadores. Hoje em dia ninguém precisa de casamento nenhum para ter filhos. Podemos ter dez filhos de dez mulheres ou maridos diferentes, que não são “concebidos em pecado”, ou “bastardos” ou outra dessas designações parvas. Ninguém tem nada a ver com isso, pura e simplesmente, e o mais importante é assumir as decisões que se tomam.
O mais curioso é que muitos casais chineses de Macau são casados segundo os costumes e tradições chinesas, ignorando por completo o registo civil. Escusado será dizer (e repito aquilo que disse aqui ontem: vivemos num estado de direito e não num estado de “fông-soi”) que estes casais são solteiros perante a lei. O casamento chinês não é reconhecido, o que significa que qualquer pessoa, mesmo sendo já casada no registo civil, pode casar pelos usos e costumes chineses. Não se verifica a idoneidade dos nubentes para contraír casamento, porque se trata simplesmente de um casamento a fingir, que vale tanto como o dinheiro do jogo do Monopólio. É dentro da tal “tradição” uma espécie de apaziguador dos deuses, uma cerimónia para “dar cara” à família – normalmente a da noiva.
Falando novamente de tradição, e agora em jeito de conclusão é curioso como existem resmas de raparigas chinesas a venderem-se em websites internacionais de casamento. Devem ser as traidoras, coitadinhas, "à rasca" para arranjar um marido estrangeiro que lhes tire das costas o peso da "tradição" e que as resgatem da Idade das Trevas. As pessoas podem libertar-se do peso da tradição, desde que "não se importem com o que os outros pensam". "O que os outros pensam" está enrolado na minha casa-de-banho ao lado da sanita. Como diz o povo (o meu povo) e com razão, "a tesão fala mais alto e a tradição dança o vira".
Ai agora quem se casa quer dizer que quer ter filhos? Onde viu isso? Grande parte dos casais casados meus amigos não planeia ter filhos. Casaram porque quiseram afirmar que se amam, se isso se trata da exclusividade que refere, que seja.
ResponderEliminarEstou cada vez mais convencido que o Leocardo é um pseudónimo de um grupo de pessoas a escrever sob a mesma égide. O seu carácter, de post para post, altera-se que é uma coisa louca. Ora vangloria a família e os costumes e tradições, ora a deita abaixo. Ora exalta a sua esposa, ora deixa perceber que a trai com tudo o que mexe. Mau! Ou isso ou estamos perante um caso de esquizofrenia. Contradiz-se demais, Leocardo. Ou será, contradizEM-se?
Você é bipolar? Geralmente as conclusões a que chega não têm qualquer lógica e contradiz-se vezes sem conta ao logo dos textos...
ResponderEliminarUma coisa é certa: se todos se preocupassem tanto em seguir as tradições, ainda vivíamos na Idade das Trevas.
ResponderEliminarCorrecto, último anónimo. Quanto aos outros ressabiados acima, eu nunca disse que as tradições "são más" ou que não devemos respeitá-las. Repare que aqui ponho "tradição" entre aspas, quando muitas vezes não passa apenas de hipocrisia. O que eu quis dizer foi que cada um tem a liberdade de fazer o que quiser com a sua vida, e nisso os chineses não são diferentes de nós.
ResponderEliminarCumprimentos.