quarta-feira, 21 de outubro de 2009
Todos os nomes (de Deus)
Deus é mau. Deus é injusto. Deus é cruel. Deus é invejoso. Saramago continua a chamar todos os nomes a um personagem que, segundo ele próprio, "só existe na cabeça dos homens". Saramago, que provavelmente se esqueceu que é português, diz que "não compreende a polémica à volta das suas afirmações, e que o seu novo livro, "Caim", despertou "velhos ódios e incompreensões". A incompreensão por alguém que tem uma opinião diferente do resto da carneirada, por exemplo. Saramago referiu estranhar que Caim seja o livro em que "mais se tem falado, embora não tenha sido lido": "É obra!", disse a propósito, sublinhando que é "magia" e "quase um milagre que certos sectores tenham conseguido dizer tanto em relação a um livro que não leram". E nem vão ler. Mesmo que o livro se venda bastante (e vai vender), serão menos de 20% os que o querem para outro efeito que não enfeitar e estante e passar uma imagem de que são "cultos", "rebeldes" e "bem lidos". À pergunta sobre se tenciona escrever sobre o Corão, respondeu que não: "Tenho mais que fazer, estou a escrever outro livro. Espero que para o próximo ano haja novo livro de José Saramago". É normal que haja quem esteja interessado em ver Saramago a escrever sobre o Corão, um livro que já equiparou à Bíblia, ou seja, um livro "mau". É que assim a malta mais mesquinha sentia-se vingada, e ainda podia ser que o vencedor do Nobel levasse um tiro.
Esse é que é o verdadeiro busílis da questão: mais de 90% dos que dizem mal de Saramago como escritor NUNCA o leram. A Santa Ignorância é uma instituição portuguesa, com certeza.
ResponderEliminarE o "Caín", quando é que sai?
ResponderEliminarAcho absurda esta situação, e bem assim o que se veicula tanto no post como no primeiro comentário. Para o caso, é irrelevante se alguém leu ou não o "Caim" ou qualquer outra obra de Saramago, uma vez que o que está a ser posto em causa são as declarações do autor e não a obra.
ResponderEliminarSe tais declarações são ofensivas para quem venera ou apenas acredita em Deus (e eu acho que podem ser), os ofendidos têm direito a opor-se-lhes, da mesma forma que ele, Saramago, tem o direito a produzi-las, o que aliás faz, ironicamente, com divina mestria.
Parece-me abusivo arrastar a "discussão" para o campo da critica à obra de Saramago.
Mas é curioso que toda esta polémica, pueril na sua substância dado que toda a gente conhece as opções religiosas e politicas do autor, serve perfeitamente os interesses de Saramago e da sua editora, que é parte de um conglomerado de interesses, ao que me é dado saber com raízes católicas.
É a vida.
Cumprimentos e que Deus vos abençoe.
Os resultados estão à vista. Uma busca no google por "saramago" + "caim" conduz-nos a 984000 entradas.Se procurarmos por "saramago" + "jangada de pedra" encontramos 748000. E se procurarmos "saramago" + "nobel" encontramos 908000 entradas. Já se procurarmos por "saramago" + "o evanjelho segundo jesus cristo" somos conduzidos a 846000 ligações.
ResponderEliminar"A Jangada de Pedra" foi publicado em 1986. Nesta obra, como que por magia, Saramago separa a Península Ibérica do resto da Europa e deixa-a à deriva. É uma obra que pretende alertar para o isolamento geográfico a que os países periféricos da União Europeia seriam vetados (imagine-se se ficassem de fora da União Europeia...). Apesar do grande absurdo da situação, não só pela situação em si mas também na mensagem política que transmite, foi um dos principais contributos para a outorga do prémio Nobel dois anos depois. Esta mensagem tinha algum acolhimento na altura, sobretudo entre os menos esclarecidos em geral e nos nórdicos em particular. Era o tempo dos eurocépticos.
A História recente retirou-lhes todos os argumentos.
Com "O Evanjelho Segundo Jesus Cristo", Saramago encontrou, talvez por mero acaso, uma boa receita para dar publicidade à sua obra. O livro "Caim" foi acabado de publicar. Existe um conjunto muito limitado de pessoas que já o leram mas já está a ser mais discutido que o livro que conduziu o autor ao prémio nobel e que a própria atribuição do prémio.
Há até quem jure a pés juntos que se trata de uma obra prima.
E, mais grave ainda, fazem-no a chamar ignorantes e incultos a quem acha um despropósito andar a ofender várias confissóes religiosas, ainda por cima, tendo como único motivo a promoção comercial de um livro.
Ainda não ouvi aqui ou em qualquer outro lado ninguém dizer que "Caim" fosse uma obra prima. O que já ouvi (aliás, estou sempre a ouvir) é gente que nunca leu Saramago a dizer que ele é um péssimo escritor. Os que não percebem o ridículo disto é que se deviam revoltar contra Deus por este não lhes ter dado o quinhão de inteligência a que tinham direito.
ResponderEliminarP.S.: Talvez encontre mais entradas no Google se escrever "Evangelho" em vez de "Evanjelho".
De facto é "evangelho" e e não "evanjelho". De qualquer forma a busca foi com "...evangelho..." pelo que as entradas são as mesmas.
ResponderEliminarQuanto ao escrever estar sempre aqui a ouvir (ou a ler) que as pessoas nunca leram Saramago, talvez quizesse dizer é que não leiem Saramago, não escrevem que não leram. Existe uma diferença enorme numa coisa e noutra. Claro que quem não entende para que serve a pontuação num texto também terá alguma dificuldade em entender para que servem os tempos verbais e porque não se utiliza apenas o infinitivo.
Na minha modesta opinião, julgo que os que de facto já leram Saramago tenham deixado de ler. Depois existem por aí muitos que nunca leram, mas, porque acham que lhes fica bem, dizem que continuam a ler. E ainda têm o atrevimento de virem chamar ignorantes aos outros.
...Se o 'Só' de António Nobre é o livro mais triste que alguma vez se escreveu em Portugal, faltava-nos quem sobre essa tristeza reflectisse e meditasse. Veio Eduardo Lourenço e explicou-nos quem somos e porque o somos. Abriu-nos os olhos mas a luz era demasiado forte. Por isso, tornámos a fechá-los. Somos um povo que prefere continuar a movimentar-se em labirintos de cegueira!...
ResponderEliminarUm abraço