segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Só com locais não vamos lá


Os trabalhadores não-residentes em Macau deram um murro na mesa e disseram "basta!" a mais uma proposta que visa reduzir o número de trabalhadores não-residentes. No meu ver, fazem muito bem, e contam com o meu apoio incondicional. Chegou a altura de dizer chega a esta macacada que visa prejudicar quem trabalha honestamente e tenta a muito custo manter-se em situação legal em Macau. Temos uma lei que não dá garantias a quem se encontre a trabalhar no território em situação legal há dez, quinze e vinte anos, mas que premeia indivíduos que "compram" o estatuto de residente permanente através do "investimento", muitas vezes em termos duvidosos e com dinheiro vindo lá sabe-se de onde. Isto para não falar de quem abre as pernas e ganha um cartão de residente, casando com um local que conheceu à dias ou em troca de um saco de patacas.

A nossa empregada, uma filipina, trabalha connosco desde que nasceu a nossa filha, vai para 11 anos. Nunca faltou, nunca ficou doente, tira férias uma vez por ano como estipula o contrato e nunca voltou atrasada, ou arranjou qualquer desculpa esfarrapada. O máximo que fez foi partir um ou dois copos, ou pedir que lhe adientemos o vencimento em dois ou três dias, o que mesmo assim terá acontecido duas ou três vezes. Nunca lhe perguntei porquê nem tenho nada a ver com isso. Quando um dia me perguntou se tinha alguma hipótese de obter o tão famigerado "white card", sugeri-lhe que encontrasse um residente com quem casar. É a única hipótese. E disse-lhe isto suspirando, com o coração nas mãos. Sã assi.

O pior é que enquanto o Governo entra com propostas para reduzir a mão-de-obra ilegal, não apresenta quaisquer alternativas. Quem vai limpar a casa? Passar a ferro? Servir às mesas? Os residentes de Macau, que pensam que nasceram com a bunda virada para a Lua e mesmo os menos iluminados da fornada acham-se no direito de trabalhar "pelo menos" num casino e culpam o Governo cada vez que a vida lhes corre mal? Imaginam-nos a servir à mesa dos restaurantes minimanente decentes? Uma vez uma senhora deputada que por acaso está de saída da AL levantou a questão da barreira linguística no que toca às babysitters e às empregadas domésticas. Mas guess what? As empregadas da China continental também são trabalhadores não-residentes. Isto torna o problema uma pescadinha de rabo na boca.

Hoje fui ao supermercado comprar fiambre. Pedi ao rapaz, um jovem chinês bastante simpático por sinal, que me cortasse dez fatias. Depois de uma batalha épica com a máquina de cortar que durou uns bons quinze minutos, contentei-me com seis ou sete fatias que mais parecia terem sido cortadas com uma Kalashnikov. O filipino do costume estava de férias, ou se calhar já levou com a bota da paranóia do extremínio dos não-residentes. É assim em tudo na vida. Uns nasceram para umas coisas, outros nasceram para outras. Não adianta enfiar as pessoas em lugares onde não têm vocação ou o mínimo jeitinho e com isto dizer que se resolve o problema do desemprego. E a qualidade?

E como este, há mil e um exemplos. Restaurantes há que não conseguem cotas de trabalhadores não-residentes e têm que se contentar com jovens locais semi-analfabetos que deixam o emprego sem sequer justificar ao fim de dois dias, levando mesmo alguns a fechar por falta de pessoal. Quem for comer aos restaurantes chineses de luxo que se encontram em alguns hotéis, percebe imediatamente que a maioria dos empregados de mesa são da China continental (agora têm uma bandeirinha ao peito com a origem). Serão estes os priveligiados? Porquê? Porque será que há restaurantes que têm uma ou nenhuma cota de trabalhadores não-residentes, demoram meses a obter a licença de funcionamento, perdendo com isso rios de dinheiro, enquanto outros abrem do dia para a noite e empregam um exército de trabalhadores não residentes? É assim que se promove o investimento e a legalidade?

Se o problema é a construção civil, façam as regras para a construção civil, e deixem os outros em paz. Empreiteiros sem escrúpulos continuam a empregar trabalhadores ilegais, são apanhados, pagam multas as vezes que for necessário e lá vão cantando e rindo. Castigem, cassem-lhes as licenças, façam pagar multas absurdas, mandem os gajos para a prisa. Qualquer coisa que lhes faça pensar duas vezes antes de violar a lei empregando ilegais que trabalhem a troco de amendoins maximizando-lhes o lucro, em deterimento dos locais que para eles são uns "chatos", que têm a mania dos "direitos laborais". Macau precisa dos trabalhadores não-residentes que tragam alguma qualidade à hotelaria, ao comércio, à roupa passada e às camas feitas. Utilizando a máxima dos Gato Fedorento: "só com locais não vamos lá".

6 comentários:

  1. 100% de acordo. O pior é que mesmo da parte do Governo se ouvem afirmações ridículas, completamente xenófobas.

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  2. Desta vez o Leocardo falou directo e claro. 200% de acordo. Talvez fizesse bem a alguns membros do Governo lerem este post... mas, há coisas neste governo que não dá para entender.., ou será que dá?mistérios de Macau!

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  3. Convinha era acertar a ortografia.

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  4. Só não concordo com essa de que uns nascem para umas coisas e outros para outras.


    http://contemplandojazz.blogspot.com/2009/08/indignidades.html

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  5. Eu não quis dizer que há pessoas que nascem fadadas para servir os outros. Toda a gente merece uma oportunidade. Só que neste caso particular de um lado existe dedicação e gratidão, e do outro existe indiferença.

    Cumprimentos.

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  6. O Leocardo está a responder para quê? Não vê que o PB só cá veio fazer publicidade ao seu próprio blogue?

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