segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Carnificina é frescura


Um dos aspectos da nossa vivência em terras do Oriente que torna a experiência realmente memorável é a frescura dos produtos que se podem encontrar nos vários mercados municipais espalhados pela cidade. Não falo propriamente dos vegetais, vindos da China e muitas vezes num estado de conservação duvidoso, mas sim da carne e do peixe, que tornam os mercados abastecedores em autênticos oceanários em ponto pequeno, ou aulas de anatomia das aves, da vaca e do porco.

Os chineses preferem sempre comprar um peixinho que ainda mexa. Vida é sinal de frescura, lógico, e é bastante comum encontrar os carapaus, as trutas ou as douradas a pular alegremente nos aquários improvisados. Nas horas de maior azáfama é possível apanhar um banho de um peixinho mais rebelde, ou assistir à luta entre o peixeiro e um espécime mais esguio, que ainda luta pela vida. Os camarões e os caranguejos, por exemplo, vão quase sempre vivos para a panela, o que aqui em casa desperta sempre uma curiosidade especial nos miúdos. É sempre uma festa.

Talvez o que mais nos impressiona é a facilidade com que a malta chinesa ceifa a vida aos peixinhos. Armados sempre de um cutelo ou uma faca afiada e comprida, esfolam, estripam e escamam o peixe sem pensar duas vezes na eventual dor que os animais possam sentir. A prova do crime está na bata, normalmente toda cagada de tripas e sangue, ou mesmo nas notas e moedas do troco, muitas vezes molhadas e cheias de escamas. Não sei se já alguém assistiu ao espectáculo único que é o amanhar das rãs. Cortam-se as cabeças num estilo que faria Pedro, o Grande corar de inveja, e arrancam-se as peles e as vísceras, ao ponto que o batráquio é entregue num saco branco cheio de sangue e ainda a mexer.

Tudo isto nos impressiona talvez porque estamos habituados ao peixe lá da praça, já mortinho da silva, já todo estripado e amanhado, pronto a ser consumido e com o olho vermelhusco (com excepção da extraordinária enguia, que ainda mexe mesmo cortada em pedacinhos), e chega a ser preciso levantar a guelra para atestar a frescura do produto. E muitas vezes apanha-se uma enorme decepção. Aqui é mesmo assim, não existem dúvidas quanto a frescura quando o mercado é um autêntico matadouro de peixes.

Depois as carnes. Nas bancas onde se vende a carne de porco ficamos a aprender a anatomia do suíno: temos o nariz, as orelhas, os fígados, os rins, os chispes, os lombos e mesmo as tripas ali penduradas, à espera de um apreciador mais audaz. Por entre a carne de vaca, delicadamente espetada nos ganchos metálicos, podemos encontrar a dobrada, ainda cheia de cabelos, a mioleira, ou a língua que parece ter sido arrancada do animal a sangue frio. As aves são as únicas chacinadas dentro do próprio mercado (pois...), e a frieza da execução é impressionante: corta-se o pescoço e deixa-se a galinha, pombo ou codorniz a espernear dentro de um balde azul de plástico, devidamente tapado.

Mas tudo isto é um espctáculo dentro do espectáculo. Para quem ainda não se habituou, é possível que perca o apetite ou sinta o estômago às voltas depois de uma visita ao mercado, mas para quem está habituado é a garantia de um bicho no prato que ainda há poucas horas fazia parte do mundo dos vivos. Como calculam o preço, o peso, ou ainda o que é um kat, é o que ainda estou para perceber. E não se pense que é fácil acordar todos os dias de manhã (de madrugada) com uma enorme vontade de cometer carnificina. E vivam os comerciantes de peixe e carne de Macau!

5 comentários:

  1. Tudo muito bonito, mas sem o minimo de condições de higiene e controlo como a própria foto documenta.
    Aliás isto de higiene os chineses são "especialistas" porque não sabem o que é....

    ResponderEliminar
  2. Em parete estou de acordo com o comentário do Anónimo.
    Hoje porém as coisas já estão um pouco mais higiéniquizadas, mas o mal continua, é ver-se nas ruas perto do mercado vermelho uns senhores a despenarem cordonizes vivas, já para não dizer mais...

    Macau são assim

    ResponderEliminar
  3. Vendo bem essa foto não foi tirada em macau, penso que a mesma foi tirada na China, já quem em Macau as autoridades não permitem isto nas ruas.

    ResponderEliminar
  4. Tem razão sr. Cambeta. É um foto aleatória tirada da internet.

    Cumprimentos.

    ResponderEliminar
  5. Ainda se vê alguns vendilhões ilegais, que certamente não sorriem para a câmara. Mas em geral a higiene é muito má, e tudo `a mostra não significa qualidade. Basta olhar para as carnes penduradas ao ar, um dia inteiro no mercado, em pleno verão, verdadeiramente `as moscas. Infelizmente Macau sã assim. Aconselhamos a carne que vem de outros países, congeladinha, ainda que descongele um bocado pelo caminho. E bem cozidinha...Nada como uma carne que vem de um sítio onde sabemos que há uma lei que protege o consumidor e o animal, e se nem disso há certeza total, imagine-se da China.

    ResponderEliminar