quarta-feira, 4 de junho de 2008

Vale uma aposta?


Já se sabe que os chineses gostam de jogar. Apostam em tudo, e a única explicação que consigo de encontrar é que este povo procura na jogatina o sal da vida, a emoção, a razão de viver. Ouvi há uns anos numa conferência sobre o jogo um certo orador espanhol (ou era americano? tinha um nome espanhol...) relacionar a predisposição dos chineses para jogar com o carácter aditivo deste povo, e chegou mesmo a trazer à conversa o ópio.

Chego a pensar que os chineses inventaram o jogo (e pronto, lá está o Leocardo a mandar bitaites sem ser especialista e ter feito "uma profunda investigação"), é que os gajos apostam em tudo: é o mahjong, o xadrez chinês, as lutas de grilos, tudo. Ainda hoje fui em trabalho com um colega a um edifício no NAPE e o gajo queria apostar comigo qual dos elevadores chegava primeiro ao rés-do-chão. Sorri, para não ficar de boca aberta.

Voltando ao ópio, está aí o Euro. O futebol é entendido para nós, ocidentais, como uma paixão, uma religião, um desporto que nos deixa de pé até às tantas da manhã, só para ter conversa com os colegas no dia seguinte. Alguns de nós também aposta, claro, mas "é só para tornar o jogo mais emocionante" (do livro "Desculpas que os perdedores dão"). Mas para a malta deste lado o Euro é mais que uma paixão. É a colheita depois de um ano de lavoura. É a high season das apostas futebolísticas, depois de meses a fio de rotina a apostar nas principais ligas europeias. É de dois em dois anos - durante o Euro e o Campeonato do Mundo - que se fazem as maiores apostas e os jogos são seguidos com maior interesse.

Basta uma visita a qualquer uma das Slots, casas de apostas licenciadas para se perceber o que significa este fenómeno. Estes locais onde se fuma e se cospe livremente não são um lugar para senhoras ou pessoas sensíveis. No Pacapio, ali na Avenida D. João IV, por exemplo, há quem passe um dia inteiro a jogar no "big and small", de boca aberta a assistir às corridas de cães e de cavalos, ou simplesmente atento às cotações das equipas que vão jogar nesse dia, sempre com imensas profanidades à mistura. O jogo é levado mesmo muito a sério.

As slots estão abertas todo o ano, e quando as principais ligas estão no defeso, chega-se a apostar nos jogos dos campeonatos chinês, japonês ou finlandês. Qualquer coisa serve para matar o vício. É engraçado observar a convicção com que alguns jogadores apostam, às vezes avultadas quantias de dinheiro. Quando ganham enchem-se de brio, e convencem-se que "percebem muito de futebol". Nada mais errado. Quem ganha duas ou três apostas seguidas não significa que perceba de futebol. Significa apenas que teve sorte. Caso contrário já existiam "listas negras" nas slots. Quando perdem filosofam sobre os vícios do futebol, falam de interesses superiores, dizem que os resultados foram combinados. "Como é possível que equipa A tenha perdido com equipa B?". É um jogo, meus amigos...

Pode-se apostar praticamente em tudo num jogo de futebol. No resultado certo, no número de golos, em quem ganha, quem está a ganhar ao intervalo, em quem marca o primeiro golo, tudo. Por alguma razão (influência de Hong Kong?) a selecção de Inglaterra é muito querida dos apostadores chineses, e as odds (probabilidades) que os ingleses ganhem quando jogam são sempre enormes. Há quem diga mesmo que a ausência da Inglaterra neste Euro (porque são uma bosta?) vá afastar alguns apostadores. Eu digo que não. Vale uma aposta?

2 comentários: