sábado, 26 de abril de 2008
Um grande equívoco
Está patente na Escola Portuguesa de Macau uma exposição fotográfica sobre o 25 de Abril, onde um grupo de alunos do 1º ano (penso eu) recria através de fotografias a preto e branco uma sala de aula dos anos 60, onde segundo eles reinava a censura e o terror. As fotografias têm legendas da autoria dos alunos, onde se lê, por exemplo, que naquele tempo "a professora mandava nos alunos", que "batia com a régua" (usam uma colher de pau para esse efeito), que "não se brincava na sala de aula", que "tinham que aprender a matéria de cor", "os professores faziam tudo o que o Salazar mandava" e provavelmente a pior de todas, "os livros da escola agora são mais giros".
Penso que aqui deve haver um tremendo equívoco. Não sei quem teve esta lamentável ideia, ou que tipo de orgulho sádico teve em explicar aos meninos que o ensino de hoje é de alguma forma melhor do que se praticava há 40 anos, ou de que os pobres professores de então pactuavam com o regime. Se há algo que Abril mudou para pior foi o ensino, que julgando pelo actual estado de coisas, mais valia ter mesmo ficado pela cartilha maternal ou a rígida disciplina que se mantinha na sala de aula.
Quando se acha mau "a professora mandar nos alunos" ou não se poder "brincar na sala de aula", é quase como dizer que a Patrícia da Escola Carolina Michaelis é uma pobre vítima, e se berrou com a professora para que lhe desse o telemóvel enquanto a puxava e tentava arrancar-lhe o aparelho das mãos, estava a "revoltar-se contra a opressora". E quem meteu na cabeça destas crianças que os professores faziam "tudo o que o Salazar mandava"? Sinceramente penso que o presidente do Conselho tinha mais em mãos que vistoriar pessoalmente tudo o que os professores faziam.
De facto os professores "batiam com a régua", e isso é deveras censurável. Mas pensar que isso foi um problema da ditadura ou dos anos 60 é errado. Frequentei o ensino básico entre 1979 e 1983 e nesse tempo os professores ainda aplicavam castigos corporais. Não que eu tivesse alguma vez sentido isso na pele, mas muitos dos meus colegas levavam reguadas e tabefes de fazer enrubescer as suas pristinas faces. Terá sido provavelmente em meados dos anos 80 que os professores deixaram de bater, não sei precisar.
"Aprender a matéria de cor" é bastante mau, sem dúvida. Mas não penso que a actual geração de cabecinhas (pouco) pensadoras seja mais inteligente ou detenha uma maior capacidade intelectual que naquele tempo. Aliás, basta trocar dois dedos de conversa com um adolescente ou pré-adolescente que não seja nosso filho (esses somos obrigados a aturar) para que se sintam naúseas. Não sabem nada de História, Geografia ou cultura geral. Os que sabem são postos a um canto e rotulados de maluquinhos. Ia-me esquecendo: os que tiram boas notas...decoraram.
Quanto aos livros, bem, não sei se perdi aqui alguma geração dourada dos livros da escola Primária, mas os de hoje e do meu tempo são uma autêntica cagada, cheios de temas fúteis, e que ensinam lições de moral rasca que me fazem pensar se afinal os miúdos andam a ser preparados para a vida real, ou para a vida de faz de conta dos autores daqueles verborreicos textos. Isso mesmo, os antigos livros da Escola Primária eram de longe melhores, ensinavam lições práticas e úteis, adequadas a crianças daquela idade. Acreditem nos velhotes, aí eles têm razão. Os de agora são mais giros,se calhar. Da mesma forma que um cão a caçar a própria cauda é giro.
Quando os mais velhos dizem que no tempo deles aprendiam tudo em 4 anos e depois iam trabalhar, isto pode parecer saudosista e até pretencioso, mas não fica muito longe da verdade. Que aprendiam os rios, as serras, a aritmética, a moral, sim, isso tudo é a mais pura das verdades. A escola era então uma instituição acarinhada, com um significado quase sagrado. O professor era um mestre, um poço de sabedoria. Era um sistema quase confuciano, de respeito mútuo, regras e distâncias estabelecidas. Hoje é uma bandalheira.
Se o objectivo era ensinar às criancinhas que o 25 de Abril foi um dia em que se alcançou "a liberdade", a educação não é nem de longe nem de perto o melhor exemplo. Podiam pegar na censura, nos presos políticos, ensinar como as pessoas nesse tempo não podiam dizer ou escrever o que pensavam, que existia um sistema de delação, uma Guerra agastante que mandava os jovens portugueses para um combate sem sentido, um país isolado mergulhado num marasmo e atraso funcional, enfim, mil e uma coisas. Mas a educação, por favor, não.
Esses livros podem ser adquiridos aqui:
ResponderEliminarhttp://www.editoraeducnacional.pt/home.php
Completamente de acordo. Mais palavras para quê, se quem ainda não viu é porque não quer ver?
ResponderEliminarNa EPM, o PREC ainda está em curso...
ResponderEliminarDe acordo com a legendagem a que se refere este 'post', a exposição é uma parvoíce irrealista e quem conduziu os alunos a tal objectivo transformou essa ideia patética numa autêntica irresponsabilidade.
ResponderEliminarA contrastar com esta patetice, fica bem lembrar as palavras do Presidente da República no Parlamento: a juventude portuguesa afastou-se da política e nada sabe da nossa História actual. Mas convém ir mais longe: os jovens nada sabem da nossa História toda, como nada possuem de cultura geral. Nem do conhecimento mais básico...
mais um episódio triste da esquerdanheta
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